As Testemunhas de Jeová e as transfusões de sangue


 Quando se estuda a Bíblia com as Testemunhas de Jeová, um dos ensinamentos promovidos pela Torre de Vigia e que são transmitidos pelos instrutores como verdade inquestionável é que por representar a vida o sangue é sagrado, por isso não deve ser ingerido e nem transfundido.

A Revista A Sentinela de 1 de julho de 1945 diz: “As transfusões de sangue são pagãs e desonram a Deus." O livro Mantenha-se no amor de Deus, página 77, declara: “As Testemunhas de Jeová entendem que ‘abster-se de sangue’ significa não aceitar transfusões de sangue e não doar ou armazenar seu próprio sangue para ser usado em transfusões. Por respeito à lei de Deus, também não aceitam os quatro componentes primários do sangue: glóbulos vermelhos, glóbulos brancos, plaquetas e plasma.”

Quais são as bases bíblicas para tal proibição? Se lermos todas as passagens bíblicas relacionadas ao sangue, perceberemos claramente que o comer sangue em parte alguma é incentivado nas Escrituras Sagradas. A primeira referência sobre não comer sangue está registrada em Gênesis 6, onde diz: Posteriormente na Lei de Moisés, a proibição do comer sangue é novamente enfatizada em diversas passagens. Uma delas, usada com frequência pela Torre de Vigia para tentar defender que a proibição de comer sangue inclui também sangue humano é a de Levítico 17:10, que diz: “Quanto a qualquer homem da casa de Israel ou algum residente forasteiro que reside no vosso meio, que comer qualquer espécie de sangue, eu certamente porei minha face contra a alma que comer o sangue, e deveras o deceparei dentre seu povo”. A Torre de Vigia enfatiza a expressão “qualquer espécie de sangue” tentando justificar sua posição.

No entanto, para uma compreensão correta de um assunto bíblico, um texto não pode ser desvinculado do seu contexto. O que o contexto nos revela? Logo após, o capítulo 13, versículo 1, diz: “Quanto a qualquer homem dos filhos de Israel ou algum residente forasteiro que reside no vosso meio, que caçando apanhe um animal selvático ou uma ave que se possa comer, neste caso tem de derramar seu sangue e cobri-lo com pó”. Assim, dizer que a Bíblia faz referência a sangue humano nas passagens sobre não comer sangue é na verdade torcer as Escrituras, dar a ela um sentido diferente do proposto pelo Autor.

Outro argumento que tenta justificar a base das Escrituras à proibição das transfusões de sangue são as passagens em Atos 15:20, 29 e 21:25, basicamente estes textos orientam à abstinência de sangue. Visto que quando estes versículos foram escritos não existia a prática médica das transfusões de sangue, a lógica nos faz concluir que o escritor se referia ao comer sangue. Se os textos estivessem se referindo a sangue humano, teríamos de admitir que existia canibalismo ou antropofagia entre os cristãos do primeiro século para que que as exortações bíblicas fizessem sentido.

Mas suponhamos que o conceito da Torre de Vigia esteja correto. Vamos partir do pressuposto de que proibição bíblica quanto ao sangue inclui sangue humano e que as transfusões são inaceitáveis a Deus. Suponhamos que aconteça que seu filho sofra um grave acidente e seja levado às pressas ao hospital. Os médicos acreditam ser necessária uma transfusão de sangue. Você é acionado, e ao chegar ao hospital se identifica como Testemunha de Jeová. Poderia de consciência tranquila para com Deus autorizar a transfusão? Vejamos alguns princípios úteis encontrados nas Escrituras que nos ajudam a tomar decisões em casos de emergência.

A Bíblia diz em Êxodo 20:8: “Lembrando o dia de sábado para o manteres sagrado deves prestar serviço e tens de fazer toda a tua obra por seis dias. Mas o sétimo dia é um sábado para Jeová, teu Deus. Não deves fazer nenhuma obra, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem teu escravo, nem tua escrava, nem teu animal doméstico, nem teu residente forasteiro que está dentro dos teus portões”. Mesmo assim Jesus mostrou que não se deve ser extremista na passagem registrada em Marcos 3: 1 a 4: “Novamente, ele entrou numa sinagoga, e ali havia um homem com a mão ressequida. Vigiaram-no assim de perto para ver se curaria o homem no sábado, a fim de que pudessem acusá-lo. E ele disse ao homem com a mão ressequida: “Levanta-te [e vem] para o centro.” A seguir, disse-lhes: “É lícito, no sábado, fazer uma boa ação ou fazer uma má ação, salvar ou matar uma alma?” Se a vida de um animal era tão importante para Jesus, de quanto mais valor é a vida de um ser humano! O próprio Cristo declarou: “Não se vendem dois pardais por uma moeda de pequeno valor? Contudo, nem mesmo um deles cairá ao chão sem o conhecimento de vosso Pai. Porém, os próprios cabelos de vossa cabeça estão todos contados. Portanto, não temais; vós valeis mais do que muitos pardais.” (Mateus 10:29-31)

Outra passagem em que aprendemos muito sobre o modo de Deus encarar as coisas é o episódio encontrado em 1 Samuel 21:6, onde em uma situação de emergência Davi e seus homens entraram na casa de Deus carecendo de alimento. O sacerdote, disse que havia apenas pão sagrado. (Segundo a lei de Moisés apenas os sacerdotes deveriam comê-lo). Mesmo assim, ele lhes deu os pães e Davi e seus homens comeram. O que Jesus disse sobre isso? Vejamos a resposta nas próprias Escrituras: “Ele lhes disse: “Não lestes o que Davi fez quando ele e seus homens ficaram com fome? Como entrou na casa de Deus, e comeram os pães da apresentação, algo que não lhe era lícito comer, nem aos que estavam com ele, mas apenas aos sacerdotes? Ou, não lestes na Lei que os sacerdotes no templo, nos sábados, não tratam o sábado como sagrado e permanecem sem culpa? Uma análise mais aprofundada da Bíblia nos faz perceber que Deus não deseja que sacrifiquemos nossas vidas ou de nossos filhos em prol de normas organizacionais como a questão do sangue. O princípio deixado por Cristo é simples: “Misericórdia quero, e não sacrifício”. (Mateus 9:13). De acordo com as escrituras, em caso de necessidade extrema, o que deve prevalecer acha-se registrado em Lucas 12:23: “A vida é mais do que o alimento”.

O próprio Deus declarou que ele prefere misericórdia ao sacrifício (Veja Mateus 12:7). Conforme João 10:10, Jesus Cristo veio afim de conceder vida, e vida em abundância. Ele próprio disse: “Ninguém tem maior amor do que este, que alguém entregue a sua alma a favor de seus amigos”. (João 15:13). 1 João 3:16 ensina que devemos dar a vida pelos nossos irmãos. E segundo a Bíblia, vida está no sangue. Portanto, sangue é vida!

Para chegarmos a uma conclusão sobre determinado assunto é imprescindível uma análise cuidadosa e ponderada dos fatos. Em relação ao que a Palavra de Deus realmente diz referente ao sangue podemos afirmar com certeza que “O amor de Deus significa o seguinte: que observemos os seus mandamentos; contudo, os seus mandamentos não são pesados.” (1 João 5:3) Os mesmo não se pode dizer concernente aos mandamentos da Torre de Vigia.

2 comentários:

  1. Excelente! Trata a questão do sangue de maneira nova, sem atacar, mas, mostrando situações que levam o leitor Testemunha a pensar, um exemplo é o caso de Davi ao alimentar seus homens com pão sagrado, impróprio para eles, o que, dentre outras coisas, deixa claro que Deus não quer sacrifícios. Posso usar esse texto?

    ResponderExcluir
  2. Fique à vontade para usá-lo inteiro ou em partes, prezada Joselaene.

    ResponderExcluir